Moçambique:
Bispos católicos denunciam «fraudes grosseiras» nas eleições e pedem «coragem
para diálogo» e para «repor a verdade dos factos»
Assassinato de
duas pessoas ligadas à oposição ao governo em Moçambique provocou manifestações
e violência alguns dias antes da apresentação dos resultados
Os
bispos católicos de Moçambique denunciam “fraudes grosseiras” nas eleições do
país, condenam o “bárbaro assassinato” de Elvino Dias e Paulo Guambe e pedem
“coragem para o diálogo e para repor a verdade dos factos”.
“Infelizmente,
mais uma vez, verificaram-se fraudes grosseiras. Repetiram-se enchimentos de
urnas, editais forjados e tantas outras formas de encobrir a verdade. As
irregularidades e fraudes, a grosso modo impunemente praticadas, reforçaram a
falta de confiança nos órgãos eleitorais, nos dirigentes que abdicam da sua
dignidade e desprezam a verdade e o sentido de serviço que deveria nortear
aqueles a quem o povo confia o seu voto. Desta forma, empurram o povo não só a
comprovar as suas desconfianças, mas também a se questionar sobre a
legitimidade dos eleitos”, afirma o episcopado Moçambicano.
No
comunicado enviado hoje à Agência ECCLESIA, apela-se à criação de “espaços de
colaboração”, considerando “um possível governo de unidade nacional”, ao
envolvimento de “instituições competentes e sérias do país na gestão dos
processos eleitorais, presentes e futuros” e à coragem para o diálogo para
“apurar de forma transparente os resultados das eleições publicando e
confrontando os editais originais na posse dos vários intervenientes”.
As
eleições em Moçambique, no passado dia 9 de outubro, incluíram votações para as
presidenciais, legislativas e para assembleias e governadores provinciais; a
Comissão Nacional de Eleições tem 15 dias para anunciar os resultados oficiais,
e a expetativa é que os resultados venham a ser apresentado este dia 24.
O
candidato presidencial, Venâncio Mondlane, da oposição ao governo, anunciou
mais dois dias de greve, coincidentes com os dias de apresentação dos
resultados oficiais, já depois dos protestos e da greve esta segunda-feira,
decorrentes da morte, no dia 19, de Elvino Dias, advogado do candidato
presidencial, e Paulo Guambe, mandatário do Podemos.
“Condenamos
o bárbaro assassinato de duas figuras políticas a relembrar com evidência, com
semelhanças no método, outros assassinatos de figuras políticas ou da sociedade
civil, também ligadas a partidos da oposição, ocorridos na sequência de
anteriores eleições”, reiteram.
Os
bispos apelam que a violência seja travada, assim como “os crimes políticos e o
desrespeito pela democracia”.
“Nós,
os Bispos Católicos de Moçambique, apelamos a todos os diretamente envolvidos
neste processo eleitoral e no conflito gerado para que façam do exercício do
reconhecimento das culpas e do perdão e a coragem da verdade, o caminho que
permita o retorno à situação normal de um país que se quer vivo e ativo e não
silenciado pelo medo da violência”, acrescenta o comunicado.
A
Igreja assume-se “apartidária”, mas diz não renunciar ao seu compromisso
“político e social” e a construção e um caminho concreto” para uma “sociedade
mais democrática, inclusiva, justa e fraterna, na qual todos devem viver em
paz, com dignidade e futuro”.
“Sendo
voz da Igreja Católica, nós os Bispos não podemos omitir de denunciar esta grave
situação que o país atravessa e a violência que gera mergulhando todos no
caos”, sublinham em comunicado.
Os
responsáveis indicam que “mais de metade dos moçambicanos” inscritos nas mesas
de voto “não se fizeram presentes para exercer o seu direito”.
“Assistimos
à mais elevada abstenção eleitoral na nossa história de eleições
multipartidárias, o que parece indicar que as irregularidades e fraudes
registadas em eleições anteriores demonstraram a grande parte da população que
a sua vontade, expressa nas urnas, não é respeitada, tornando inútil o
exercício deste importante direito cívico”, lê-se no comunicado.
Os
bispos moçambicanos dizem que perante as fraudes grosseiras, “a aplicação da
lei eleitoral na fase do apuramento dos votos a nível nacional por parte das
autoridades competentes” não poder ser garantida e que “certificar uma mentira
é fraude”.
Os
responsáveis alertam para o “descrédito nas autoridades”, pedem que a juventude
seja “escutada” mas alertam os jovens para “instrumentalização” e pedem que
“não se deixem arrastar em ações de vandalismo e desestabilização”.
“Reafirmamos
mais uma vez que a maior riqueza nacional é a nossa juventude. É uma juventude
nascida em tempo de paz, tem direito à paz e quer a paz. Não podemos deixar que
partidos políticos e grupos de poder continuem a promover as suas influências
nefastas sobre ela, incutindo políticas de desprezo, de ódio e de vingança ou
demonstrando ausência de valores de respeito pela verdade e honra”, indicam.
Os
bispos finalizam o comunidade dizendo que o país “merece a verdade, a paz, a
tranquilidade e a tolerância” e pedem “artíficies de justiça e testemunhas da
verdade”.
Fonte:
Agência Ecclesia