O tempo passa, e nós também
Dom Leomar Antônio Brustolin - Arcebispo
de Santa Maria (RS)
Nesse mês
de novembro, chegando o final do ano, é importante refletir sobre o fim, sobre
o término do tempo e da vida, para assim adquirir um olhar mais profundo sobre
a nossa condição humana. A valorização da vida supõe atenção à
sacralidade e à qualidade de vida das pessoas. Os dois princípios não se
excluem. A vida continua sendo o mistério que escapa à total intelecção e
determinação da ciência.
A
nossa existência é pautada por perguntas e necessidades, sonhos e esperanças,
tristezas e angústias. A vida humana, portanto, tem uma dignidade sagrada
porque emerge da vontade e do poder criador do Eterno.
A
reflexão sobre a vida não deixa de contemplar o limite e as perdas como ocasião
de compreender o mistério da existência A sociedade de consumo e a busca do
bem-estar ensinam que só vale a pena viver se há o máximo de satisfação e
prazer. O doente, o agonizante, o indesejado e tantos outros sujeitos humanos
são excluídos desta lógica.
A
morte traz consigo novas interrogações e discussões. Cada área do conhecimento
humano tem sua percepção sobre esta dimensão. Algumas respostas são mais
positivas que outras.
A
natureza humana é indigente. Ao nascer percebe-se as carências psicofísicas das
pessoas que precisam de tempo para poder passar da dependência total e crescer
na autonomia e liberdade dada às criaturas humanas. O tempo vivido neste mundo
faz com que a pessoa sempre esteja em profundas mudanças, passando por crises,
novas experiências, limitações físicas e psíquicas.
Presente
e futuro nos fascinam tanto porque queremos vislumbrar as conquistas e
realizações, quanto nos atemoriza a frustração, o limite e o fim. O tempo passa
e com ele passamos também nós. Nascemos, crescemos, amadurecemos, envelhecemos
e morremos. Este percurso da existência humana é uma realidade fascinante. Há
quem sofra o horror deste princípio de impermanência de tudo o que vive. Há,
contudo, quem encontre a razão de ser e existir entre este movimento de nascer,
viver e morrer.
O
ser humano é a única criatura que tem consciência de sua finitude. Sabe que o
viver comporta o morrer. Conhece a passagem do tempo como uma experiência
dinâmica que tende ao morrer. A consciência da mortalidade leva a pessoa ao
desejo de imortalidade. Os animais desejam sobreviver, querem viver e resistem
aos desafios que levam ao findar. Os seres humanos, mais do que sobreviver não
querem morrer. É uma inquietude que permanece no coração humano, refratando as
hipóteses de um dia não mais existir. A questão emergente é como saborear o
tempo limitado que a vida oferece para alguém realizar-se em sua
existência. Se por um lado há uma melhor qualidade de vida do que num
passado recente, graças ao conforto tecnológico e aos conceitos de vida saudável,
por outro lado, cresce o número de excluídos num mundo globalizado e
surpreende-nos tanto as catástrofes naturais as quais não temos total controle,
quanto o terrorismo e a violência urbana que explodem pelo planeta. Diante da
insegurança, da vulnerabilidade e do medo, crescem as limitações de uma vida
livre e feliz.