Igreja, sínodo e sinodalidade
Dom Wilson Angotti - Bispo de
Taubaté (SP)
O
Papa Francisco convocou um sínodo dos bispos para ser realizado em duas etapas:
a primeira foi em outubro de 2023 e a segunda em outubro de 2024. Os sínodos
anteriores a esse tiveram temáticas variadas, sobre: evangelização, família,
educação, vocações, Amazônia, ecologia, etc. O sínodo atual tem uma
peculiaridade: trata sobre a sinodalidade; ou seja, a maneira como a Igreja
deve viver a dimensão sinodal. Como o Santo Padre fez questão de envolver todas
as instâncias da Igreja na reflexão sobre esse assunto, muito se tem falado
sobre sínodo e sinodalidade. É sobre isso que trataremos nesse
espaço.
O
que é sínodo e sinodalidade – A palavra sínodo vem de dois termos gregos “syn”
que significa “com” e “odós” que significa “caminho”; portanto, sínodo
significa todo empenho para se fazer juntos um mesmo caminho; um caminho com
outros. Quem absolutiza as próprias ideias e não caminha com os outros fere a
comunhão eclesial e não age como Igreja. Sínodo é um recurso que a Igreja
utiliza, desde os primeiros séculos da era cristã, reunindo pessoas para juntas
refletir e decidir caminhos comuns sobre sua vida e missão, sobre questões de
doutrina ou de disciplina eclesiástica. Nos primeiros séculos do cristianismo
os sínodos foram muito frequentes, depois menos. Quando se fala em sinodalidade
se faz referência a disposição ou a atitude de se buscar um caminho comum; um
caminho a se percorrer conjuntamente. Para que se possa fazer um caminho comum
é necessário exercitar-se na escuta do outro, valorizar o que o outro pensa e
não querer impor nossas concepções pessoais. Além de cada um estar predisposto
a acolher o que o outro pensa, a sinodalidade exige também uma disposição de
todos em procurar discernir o que Deus quer de nós. Esse discernimento acerca
da vontade de Deus, não se dá por maioria de votos, mas vai se formando pela
atenção àquilo que Deus nos inspira pela oração, pela reflexão da Palavra, pelo
que Deus nos fala por meio dos outros e pelos acontecimentos. Podemos dizer que
sinodalidade ou espírito sinodal é a atitude que torna possível o sínodo.
Um
pouco de história – Ainda nos primeiros anos da vida da Igreja, temos o relato
bíblico daquilo que se convencionou chamar de “Concílio de Jerusalém”, quando
os Apóstolos, diante de um impasse, reuniram-se e decidiram que aqueles que se
convertiam do paganismo, ao se tornarem cristãos, não precisavam assumir
práticas judaicas (cf. At. 15). Essa maneira de decidir se tornou, na Igreja,
como um modelo de decisão tomada em comum. Depois disso, os primeiros sínodos
da Igreja, que se tem registro, foram realizados na Ásia Menor (região da
Turquia), entre os anos 160 e 175. Esses sínodos se ocuparam em combater o
Montanismo (uma heresia dos primeiros séculos), em estabelecer a data da
Páscoa, em reafirmar as verdades da fé sobretudo em relação a Cristo, ao perdão
dos pecados, a autoridade dos bispos em suas igrejas particulares, questões
disciplinares, etc. O século terceiro registrou diversos sínodos próximos a
Roma, ao norte da África, em Antioquia e outros lugares. Esses sínodos
antecederam e prepararam o primeiro Concílio ecumênico de Nicéia, em 325 e, em
seguida, o de Constantinopla, no ano de 381, ocasiões em que formularam nossa
profissão de fé, utilizada na liturgia até hoje. O concílio também é uma
assembleia sinodal. Um concílio é ecumênico (ou seja, de toda a terra) quando
reúne os bispos do mundo todo e é convocado e presidido pelo Papa. As decisões
sinodais foram se impondo como expressão de comunhão eclesial, sobretudo depois
que se firmara a autoridade dos bispos em suas igrejas particulares (ou
dioceses). A sinodalidade é expressão da corresponsabilidade episcopal pelo bem
de toda a Igreja e também expressão da comunhão eclesial. Na Igreja o conceito
e a prática da sinodalidade, quer na forma conciliar como sinodal, evoluíram
tanto no Oriente como no Ocidente. Posteriormente, no Ocidente, os sínodos
foram se tornando menos frequentes e deu-se acento maior à autoridade do Romano
Pontífice. Com a realização do Concílio Vaticano II (1963 a 1965) e o retorno
às fontes bíblicas e da Tradição, foi revalorizada prática da sinodalidade.
Assim sendo, no ano de 1965, na abertura da última sessão do Concílio, diante
de 2.265 bispos, o Papa Paulo VI, restabelecia a instituição do Sínodo dos
Bispos que reuniria representantes de todo o mundo. Com isso se enfatizava a
corresponsabilidade dos bispos para com toda a Igreja. Estabeleceu-se que os
sínodos ocorreriam a cada cinco anos, para considerar as questões universais da
Igreja e assessorar o ministério Petrino, sem com isso em nada reduzi-lo.
A
sinodalidade na Igreja – O espírito sinodal ou sinodalidade se mostra de tantas
maneiras na vida e missão da Igreja, em todas as suas instâncias.
Universalmente, além de concílios e sínodos, temos os dicastérios romanos que
assessoram o Papa no governo da Igreja e têm sido, cada vez mais, expressão da
universalidade da Igreja, assim como o colégio dos cardeais. Em continentes e
em países temos as Conferências Episcopais, ricas expressões de comunhão e
sinodalidade, pelo empenho em caminhar juntos. Nas dioceses e paróquias,
concretizando o espírito sinodal, temos as assembleias pastorais, o Conselho de
Pastoral, o Conselho Administrativo e Econômico, o Conselho de Presbíteros,
etc. Com essas e outras instâncias nos exercitamos em ouvir os outros a fim de
tomar as melhores decisões para caminhar juntos e fortalecer a comunhão, que é
essencial na Igreja de Cristo.